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Por uma Metodologia Histórico-Ecológica da Serra do Brigadeiro, das suas comunidades e do PESB

Por Nicélio Barros

As leituras históricas da relação entre sociedade e natureza acompanham problemáticas contemporâneas, e dialogam com o estudo do cotidiano e com as disputas de memória; é o caso das cobranças ecológicas e do processo de desenvolvimento regional presentes nas narrativas das comunidades e territórios espalhados pelo mundo.

Objetivo aqui apresentar uma proposta para o debate teórico e metodológico que possa vir a ser realizado pelas comunidades da Serra do Brigadeiro a partir da realização e da interpretação das narrativas colhidas.

De forma bastante incipiente – uma ideia inicial que pode vir a formar um Grupo de Estudos (GT) –, trata-se de entrevistas, depoimentos escritos e arquivos fotográficos produzidos e reproduzidos dos entrevistados. Essas narrativas imagéticas e de história de vida deverão ser avaliadas a partir de um olhar dialógico, preocupado com saberes locais e com a produção de fontes históricas.

Nesse estudo de narrativas orais e imagéticas relacionadas é preciso que se faça a análise das demandas de sustentabilidade e de políticas ambientais, mais especificamente na apropriação de discursos ambientais no processo de colonização, povoamento e formação social, econômica e cultural da Serra do Brigadeiro, incluído aí a criação do PESB. Ou seja, uma problemática que nos remete a um recorte temporal correspondente a documentos e relatos que vão desde o século XIX ao momento presente, o que envolve um corpus documental bastante variado e desafiador – público e particular. E, sobretudo, as memórias de pessoas que possam relatar/identificar/memorizar momentos importantes de suas vivências e de antepassados no território da Serra do Brigadeiro. Essas narrativas imagéticas e orais (de história de vida) devem ser avaliadas a partir de um olhar dialógico preocupado com os saberes locais e com a produção de fontes históricas.

Assim, em um primeiro eixo me parece ser necessário a construção de uma base de leituras, pautadas em categorias e conceitos tais como: contexto da colonização regional a partir de políticas e de historiografia pertinente; problemáticas em torno da relação sociedade e natureza; debates referentes às possibilidades teóricas metodológicas da História local; discussão de conceitos presentes nas narrativas e discursos históricos, tais como comunidade, progresso e ecologia; análise teórica e metodológica dos usos da História Oral.

Em um segundo eixo me parece oportuno a produção de narrativas orais, focada no sentido que é preciso que nos interessemos pelos problemas de uma história ecológica. Ecológica em seu pleno sentido semântico, social e político. A História oral local requer um tipo de conhecimento diferente, dependente do entusiasmo do historiador, podendo ser encontrada subindo ou descendo a serra, na curva da estrada, tomando café e comendo broa, virando naquele morro, desbravando aquela capoeira, dobrando a esquina, descendo a rua etc. Desse modo, ao invés de considerar a localidade por si mesma como objeto de pesquisa, o historiador poderá escolher como ponto de partida algum elemento da vida que seja por si só, limitado tanto em tempo como em espaço, mas usado como uma janela para o mundo”.

O entendimento do debate aqui proposto pode ser constatado com os estudos do conceito de meio ambiente proposto por Enrique Leff (2005) na obra “Construindo a história ambiental da América Latina”. Para o autor a história ambiental não deveria ser vista apenas a partir das críticas aos impactos do capitalismo, mas numa abordagem hermenêutica preocupada com saberes locais: “a história ambiental viria assim a ressarcir o esquecimento da história (a pesar do fato que a natureza sempre tenha sido referente de narrativas e produções estéticas) e em particular na concepção moderna de mundo e da produção material que desnaturaliza a natureza, que rompe suas inter-relações e ignora sua complexidade, convertendo-a em recurso natural”. (LEFF, p.16).

Leff faria convergir duas pertinentes preocupações teóricas: a do recorte e as implicações da História Local e a da relação sociedade e natureza pensada a partir de saberes locais, e isso nos indica uma abordagem processual. A aproximação com o local subsidia nossos esforços de interpretação e pesquisa pelos quais avaliamos os “limites” do conceito de comunidade. Nas palavras de Zygmunt Bauman: “[…] há um preço a pagar pelo privilégio de “viver em comunidade” — e ele é pequeno e até invisível só enquanto a comunidade for um sonho. O preço é pago em forma de liberdade, também chamada ‘autonomia’, ‘direito à autoafirmação’ e ‘à identidade’” (BAUMAN, 2003, p. 10).

Por fim, outra problemática a ser construída remete a relação entre as posturas ecológicas e as reivindicações pelo reconhecimento individual na história oficial de cada município constituinte da Serra do Brigadeiro. O próprio estudo do acervo imagético a ser levantado poderá contribuir para essa análise.

Concluindo, o intuito do artigo é o de apresentar a proposta para um estudo da memória da Serra do Brigadeiro, das comunidades do seu entorno e do PESB; pesquisar sobre memórias de moradores do território e entorno a partir da vertente da história ambiental e suas interfaces com a história oral e local, buscando utilizar como metodologia o processo construção de entrevistas e imagens, correlacionando-a com imagens de jornais e da literatura existente vinculadas aos personagens, comunidades e instituições. Creio que seja preciso evidenciar o significado da construção de um acervo historiográfico e da consequente valorização da produção de fontes históricas na Serra do Brigadeiro, territórios e PESB.

REFERÊNCIAS:
BAUMAN, Zygmunt (2003). Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
GIOVANNINI JUNIOR, Oswaldo (2006). Os povos da Serra dos Arrepiados: suas festas, sua cultura. Araponga: CEPEC.
KOSSOY, Boris (2009). Realidades e ficções na trama fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial.
LEFF, Enrique (2005). Construindo a história ambiental na América Latina. Esboços, v. 12, n 13.

setembro 28, 2021
Memórias pela Serra , post , Single Post
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